A review by rltinha
Eu Confesso by Jaume Cabré

5.0

Desde as memórias de Yambo (A Misteriosa Chama da Rainha Loana, 2004, Umberto Eco) que não encontrava uma revisitação da vida passada que fosse tão de papel quanto de emoções puras.
Aqui temos um Adrià confessor. Confessa acima de tudo culpas avulsas que expiou e a Culpa maior para a qual procura perdão. A ironia é ser tão pouco culpado em ambas, tanto nas avulsas e menores, como na principal e objecto da confissão.
Apenas sendo senhor de si mesmo enquanto cultor do saber, nas relações humanas falha na exacta medida em que acerta plenamente. Há menos censura do que se imagina quando se dissecam as falhas com os outros.
Adrià é saber e solidão, culpa num turbilhão de memória regurgitada e pluriparticipada num dispositivo narrativo de virtuosismo escritor sem uma só façanha em excesso. E até num prosaico desencaixotar de livros numa mudança de casa e organização de uma biblioteca pessoal Cabré dá ao leitor uma remake d’A Criação. Uma celebração da existência livresca quotidiana feita génesis do nascimento de cada leitor para si próprio, tão habilmente comparticipado pelo amigo enquanto família escolhida.
O insucesso comercial deste livro em terras lusas é digno de estudo. Não se compreende como um leitor que aprecie sê-lo possa ficar aquém de rendido.