A review by ana_ribeiro
Morreste-me by José Luís Peixoto

5.0

A primeira vez que li este livro foi algures em 2009 quando o adquiri, adorei imenso e fiquei maravilhada com a escrita; sendo que o JLP tinha apenas 22 anos quando escreveu este texto (transformado em livro). E a riqueza e complexidade da escrita já eram tão grandes, já tinha um talento inigualável. Impossível não gostar, não se ficar rendido e conquistado. Eu fico sempre.

"Agora, és o rio e as margens e a nascente; és o dia, e a tarde dentro do dia, e o sol dentro da tarde; és o mundo todo por seres a sua pele. Pai."

Incrível a forma como olha a perda do seu pai.

Este ano perdi a minha avó materna precisamente da mesma doença que vitimou o pai do JLP: o cancro. Sabia que quando decidisse reler este livro iria ter um sentido e uma importância muito diferentes. E teve. Revi-me tantas e tantas vezes nas palavras dele, voltei tantas e tantas vezes ao hospital, aos últimos momentos da minha avó, ao seu sofrimento, luta e esforço. Até os pensamentos foram sôfregos assim como a leitura.

"No quarto, numa cama qualquer que não a tua, o teu corpo, pai. (...) O ar com que lutavas, lutavas sempre, gritava o seu caminho rouco"

Nesta frase esta presente a última imagem que guardo da minha avó: ela ali, naquela cama do hospital, deitada e adormecida, com aquela respiração precisamente... rouca. =(. Fez-me relembrar tanto. Nem imaginam o quanto.

"És brilhante entre os que dormem. Pai."

A leitura como disse é sôfrega, penso que o texto assim o exige, o texto tem pouca pontuação resumindo-se a vírgulas e pontos finais, obrigando a uma reflexão continua e existencial. Por entre memórias, viagens, saudade e perda entramos no subconsciente do autor, nos seus pensamentos e sentimentos. Nos desejos e na dor.

Difícil controlar as lágrimas e a emoção que nos consome a cada palavra, a cada pausa.

Amei este livro, como seria de esperar. A leitura foi dura, mas ainda mais marcante.

"Parou a chuva no céu. E eu quis-te levar. Fizeste tanto por mim, fizeste-me, e só pude te levar."

"É luz o tempo, Pai."

"Parto de ti, viajo nos teus cominhos, voto, perco-me e desencontro-me no enredo de ti, nasço, morro, parto de ti, viajo no escuro que deixaste e chego, chego finalmente a ti."

"Ficou o teu sorriso no que não esqueço, ficaste todo em mim. Pai."

Leitura recomendada! Não deixem de ler.