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Aparição
by Vergílio Ferreira
- Que me diz ao meu escritório privativo?
Era uma sala pequena de abóboda alta, dois maples, uma mesa, estantes e alguns quadros. Uma grande janela dava para o pátio deserto, onde a água estalava sem cessar. Sofia acendeu a luz e fechou a janela. E nesse claustro de intimidade, com a chuva afastando-nos a cidade para longe, sentíamo-nos numa solidão para os dois e era como se o mistério de Sofia me fosse mais revelado ou menos invulnerável.
- Está-se bem aqui - disse eu.
O calor fechado do irradiador eléctrico, o silêncio inconsútil, vigiado pela chuva, a nossa presença defendida, como que legitimavam a minha excitação, o apelo voraz que subia em mim. Mas havia a conveniência, esse plano neutral em que podíamos comerciar.
E perguntei:
- Estudou a lição?
- Não peguei em livro - disse ela, sorrindo por entre o fumo do cigarro. - Não está contente?
- Contente? Porquê?
- Ouça, doutor: se alguma coisa me preocupou sempre foi ser consequente, unir o que faço ao que sinto. Porque não faz o mesmo?
- Como não faço o mesmo?
- Oh, não faz... Se o fizesse, já me tinha beijado...
A violência que me apanhou não foi súbita. Houve um silêncio de atordoamento.
Era uma sala pequena de abóboda alta, dois maples, uma mesa, estantes e alguns quadros. Uma grande janela dava para o pátio deserto, onde a água estalava sem cessar. Sofia acendeu a luz e fechou a janela. E nesse claustro de intimidade, com a chuva afastando-nos a cidade para longe, sentíamo-nos numa solidão para os dois e era como se o mistério de Sofia me fosse mais revelado ou menos invulnerável.
- Está-se bem aqui - disse eu.
O calor fechado do irradiador eléctrico, o silêncio inconsútil, vigiado pela chuva, a nossa presença defendida, como que legitimavam a minha excitação, o apelo voraz que subia em mim. Mas havia a conveniência, esse plano neutral em que podíamos comerciar.
E perguntei:
- Estudou a lição?
- Não peguei em livro - disse ela, sorrindo por entre o fumo do cigarro. - Não está contente?
- Contente? Porquê?
- Ouça, doutor: se alguma coisa me preocupou sempre foi ser consequente, unir o que faço ao que sinto. Porque não faz o mesmo?
- Como não faço o mesmo?
- Oh, não faz... Se o fizesse, já me tinha beijado...
A violência que me apanhou não foi súbita. Houve um silêncio de atordoamento.