A review by katya_m
Sonho de uma Noite de Verão by William Shakespeare

Quando em 1920*, Almada negreiros proclamava, e não sem razão, "Nós não somos do século de inventar palavras. As palavras já foram inventadas. Nós somos do século de inventar outra vez as palavras que já foram inventadas.”, esquecia que já uns séculos antes a sua fórmula se aplicava. Shakespeare não pode realmente ser louvado por criar o que jamais tinha sido pensado, mas sim por, depois de demorado estudo, atribuir ao que já existia, de uma ou outra forma, novas e belas roupagens. É isso que torna a fazer em Sonho De Uma Noite De Verão, e nem por isso deixa de ser genial.
E, com uma ação tripartida por três mundos: mitológico (antigo), contemporâneo - de Shakespeare, e feérico; este conto de fadas tem os ingredientes certos para agradar a gregos e troianos.

ATO I CENA I
Nos esponsais de Teseu e Hipólita, Hérmia, prometida a Demétrio, planeia fugir com Lisandro. Entretanto, Helena, apaixonada por Demétrio, e não correspondida, decide denunciar o local do encontro dos fugitivos na esperança de lhes gorar os planos.

ATO I CENA II
Já em plena Inglaterra Tudor, um grupo de artesãos ensaia a peça Píramo e Tisbe para a festa de casamento.

ATO II CENA I
Enquanto isso, Oberon, rei das fadas, melindrado por uma recusa de Titânia, a rainha, planeia a sua vingança: um soro que a fará apaixonar-se pela primeira criatura que vir ao acordar.

Daqui se depreende que a história terá de dar muitas e divertidas voltas... Mas, mesmo assim, está muito longe de ser uma peça da minha preferência. Estou amarrada às tragédias para a vida, de livre e boa vontade!
No entanto, goste eu mais ou menos, alguns elementos arquitetados e trabalhados por Shakespeare fazem desta uma peça extraordinária:

• A nomeação de Teseu - o maior herói e rei ateniense, ferveroso defensor da democracia - enquanto espécie de pater familias que governa o mundo antigo e que decidirá a justiça do desfecho dos amores desavindos dos dois jovens casais;
• A criação de um interlúdio satírico a cargo dos artesãos incultos onde toma forma aquele que é o tema e a inspiração para Romeu E Julieta - a tragédia dos amores frustrados de Píramo e Tisbe;
• Opções de estilo e verso como o uso do verso branco para a realeza, a prosa para os personagens populares e o verso rimado para os amantes;
• Ou a permissão dada a Robin Goodfellow para desdenhar dos homens: "Que doidos os mortais são!".

No fim, é uma comédia que se dá melhor encenada do que lida - são a experiência e o gosto próprios a falar, claro.