A review by natelha
Cleopatra and Frankenstein by Coco Mellors

emotional reflective sad slow-paced
  • Plot- or character-driven? Character
  • Strong character development? Yes
  • Loveable characters? Yes
  • Diverse cast of characters? Yes
  • Flaws of characters a main focus? Yes

4.5

 Cleo e Frank se conhecem e clicam logo de primeira. A garota é uma artista de 25 anos com uma vibe que me lembrou muito da Scarlett Johansson em Lost in Translation (mas eu posso estar incrivelmente errada porque faz anos que eu assisti esse filme). Enquanto isso, Frank é um publicitário de 40 e poucos anos, muito bem sucedido. Rapidamente eles começam um relacionamento e acabam se apressando em um casamento (por que o visto de estudante de Cleo, que é inglesa, acaba em seis meses). A partir daí, a gente começa a acompanhar o casamento dos dois a partir do ponto de vista do casal, mas também de algumas pessoas em volta deles: a irmã  e os melhores amigos de Frank, o melhor amigo de Cleo e a nova funcionária de Frank. Dessa maneira, a gente vai conhecendo mais sobre o casal, mas também sobre todo mundo em sua volta.

Eu não sei se explicando assim eu faço jus ao livro. Mas ele é muito bom. A Coco Mellors disse que levou 7 anos pra escrever e faz sentido, sabe? Todos os personagens são muito bem escritos, muito profundos. Nos capítulos deles você sabe sobre o Frank e a Cleo pelas circunstâncias, mas eles tem um brilho muito próprio e acho que não teve um personagem que eu não gostei. Andar uma milha nos sapatos de alguém. Falei isso em um dos meus históricos de leitura e acho que esse é o acerto do livro. Eu não consigo não gostar de nenhum dos personagens depois de andar um capítulo nos sapatos deles. É uma experiência de empatia.

Tinha visto muita gente comparando com Sally Rooney mas achei bastante diferente. Ainda é bem focado no que as pessoas estão sentindo mais do que no que elas estão fazendo. Mas ainda assim, eles o que eles fazem tem mais relevância aqui do que na Sally Rooney. Todos os personagens daqui também são mais velhos do que os personagens da Sally Rooney. Eles ainda não sabem muito bem o que fazer da vida. Mas ver gente de quase 50 anos não saber o que fazer da vida é diferente de gente de 20 e poucos anos.

O livro é denso, me levou uma boa semana pra ler (o que pros meus parâmetros de leitura do último mês é muito tempo), mas a escrita é maravilhosa. Pra você sentir empatia, por pessoas que até um capítulo atrás você tava odiando, é muito óbvio que a escrita é boa. Depois de um tempo você percebe que muito do que você está sentindo, é programado pra ser assim. A autora tá escrevendo de um jeito pra te fazer sentir desse jeito. O que ao meu ver é maravilhoso. Parece até bruxaria. 

Acho que sou uma amante de histórias imperfeitas porque elas são reais. E é isso que a gente tem aqui, sabe.

É isso que a gente tem aqui. A prova de que, por mais que tanto conteúdo tente mostrar o contrário, amor nem sempre é o suficiente. Assim como pra Françoise e pro Gui, Mr. Chow e Mrs. Chan, Mia e Sebastian. Mas como a própria Cleo fala no fim, me dá esperança.

É simples se você pensar. Não tinha como não ter passado pelo o que eles passaram juntos. Foi importante pra eles poderem chegar no que eles tem agora e agora eles são felizes. É a história de deixar a fita rolar que o Frank conta, só que ao contrário. Ali no meio tava horrível, até pra mim que não tem nada a ver com a vida dos dois indivíduos (que nem existem), talvez eles tenham desejado nunca ter se casado, mas deixando a fita rolar eles ficam bem, eles se encontram no mundo. Mesmo quando eu adoro um filme ou um livro sobre um casal que não fica junto, eu ainda sou uma romântica incurável.

E por falar em romance acho que chegou a hora. A hora de falar de como eu me apaixonei por um casal, mesmo sabendo que talvez não fosse o ideal, mesmo que eu tivesse torcendo por um casal 50% diferente só um capítulo antes. Eleanor. Os capítulos dela foram de alguma forma, um alívio. Sinto que se um dia eu tivesse que escrever um livro ia ser inteiro do jeito que foram os capítulos dela. Achei incrível como você consegue entender tanto sobre alguém em cenas tão pequenas. Eu tive impressão de estar dando piscadas duras e demoradas enquanto observava a vida de alguém. Como se eu estivesse com sono, mas lutando contra o fato, sabe? Achei essa imagem tão bonita.

Na verdade, adorei acompanhar a visão de todos os personagens, a forma como eles foram mostrando que tá todo mundo mal e tá tudo bem, alguns mais inesperados do que outros. Adorei a Zoe com o Jiro, o que eu achei que fosse odiar (inclusive, acho que eu sou a Zoe da minha irmã), adorei o Santiago porque acho que nunca li sobre um personagem gordo masculino (e nem em um livro que se pretende mais sério), achei muito interessante como foi tratada a questão emocional relacionada a compulsão e o impacto na auto-estima que isso causa. Até do Anders, eu gostei, até ele parecia tão apaixonado de verdade pelas palavras da Coco Mellors. Esqueci de falar do Quentin, mas acho que ele de fato foi o menos abordado, talvez se a gente tivesse mais um capítulo dele mais pro fim do livro.

Nossa, é tanta coisa pra falar ainda!

Tipo, vocês perceberam o papel de Manhattan na história? Ela é tipo uma produtora de tristeza. No fim da história, Anders foge pra Los Angeles, Cleo pra Roma e o Frank foge pro Brooklyn com uma mulher de New Jersey pra ser feliz. Vi um artigo do LA Times falando que Manhattan é construída como uma droga no livro e acho que em certa medida eu concordo. Quentin continua lá, mas ao mesmo tempo Zoe e Santiago também, e os dois estão melhores do que estavam no começo do livro (ainda que Santiago tenha escapado pra Los Angeles pra ter epifania que o leva a felicidade).

Enfim, fiquei um tanto de tempo tentando definir sobre o que esse livro é. Mas não consegui. Acho que é sobre mudança, mas talvez seja só porque elas tão tão presentes na história. Talvez seja sobre tentar. Cleo tenta encontrar uma família, Quentin tenta aceitar quem ele é, Zoe tenta encontrar propósito, Eleanor tenta encontrar sossego, Anders tenta encontrar amor, Santiago busca amor-próprio e Frank… Eu acho que no início o Frank nem sabia que ele procurava alguma coisa, mas acho que o que ele quer tá no meio de tudo isso ai, ele quer família e amor e propósito. Todo mundo está seguindo a algum lugar, mesmo que eles não saibam que estão.


Não queria terminar sem falar da Jesus. Ícone. RIP.

Expand filter menu Content Warnings