A review by anabrca
Caliban and the Witch: Women, the Body and Primitive Accumulation by Silvia Federici

5.0

Este livro é uma pesquisa sobre a condiçao das mulheres na "transiçao" do feudalismo para o capitalismo. Repensa a analise da acumulaçao primitiva de "O Capital", vol.1, de Karl Marx e também "A Teoria do Corpo", de Michel Foucault, sob o ponto de vista feminino.
O titulo vem de dois personagens da peça shakesperiana "A Tempestade": O Calibã representa o rebelde anticolonial, simbolo do proletariado, especificamente o corpo do proletariado como terreno e instrumento de resistência da logica capitalista.
A Bruxa (Sycorax, mae de Calibã) é a concretizaçao de um mundo de assuntos femininos que o capitalismo tinha que destruir: a herética, a curandeira, a esposa desobediente, as mulheres que queriam morar sozinhas, etc
A caça às bruxas, sob um regime patriarcal opressor, foi uma guerra contra as mulheres para denegri-las, demoniza-las, domestica-las e destruir seu poder social, visava também destruir o controle que as mulheres exerciam sobre seu corpo, sua sexualidade e sua funçao reprodutiva. A mulher foi confinada no lar, sem direito a um salario. Mesmo as que trabalhavam, o salario ia para os maridos. Elas perderam toda autonomia, principalmente financeira, foram retiradas dos espaços publicos, proibidas de terem acesso à educaçao, à vida politica e religiosa, foram confinadas apenas para a reproduçao, as ricas para gerarem herdeiros e as pobres para gerarem mao-de-obra barata. Elas ficaram dependentes do homem para tudo.
A igreja através da santa inquisiçao que se auto-intitulou como a justiça de deus na terra, cometeu o maior feminicidio da historia da humanidade, participou ativamente da colonizaçao e converteu à força, por meios da violência, tortura e mortes, indios e escravos. Além do feminicidio, foi conivente também com o massacre de 2/3 dos nativos da América e a escravidao dos africanos e nativos.

Para o avanço capitalista, toda forma de comunalismo tinha que ser destruida, como os anabatistas que seguiam os passos dos primeiros cristaos de dividirem tudo entre eles em partes iguais, ou os indigenas ou tribos africanas que faziam o mesmo. O comunalismo deu lugar ao individualismo.

A igreja também politiza a sexualidade e regula o comportamento sexual. O casamento torna-se um sacramento no séc. XII, nenhum poder na terra pode dissolver o matrimonio. A igreja intensifica o ataque à sodomia.
Nos séculos XIV e XV o estupro é descriminalizado, se uma mulher é solteira, viuva, doméstica ou esta sozinha na rua, o homem se vê no direito de estupra-la e nada acontece judicialmente, pois ela que esta errada em nao ter um homem ou de ter que andar sozinha. Uma vez estuprada, perde a dignidade, nao vai arrumar um casamento e so resta a prostituiçao. Começa entao o culto à virgindade, à castidade, à pureza, etc. Dai surge o argumento de mulher para casar e mulher para se divertir.

Durante a colonizaçao, a primeira geraçao de mestiços nascida na América foi concebida através do estupro de mullheres nativas e escravas africanas.

Ha a institucionalizaçao da prostituiçao na Europa com a abertura de bordeis municipais e o aval da igreja que justifica que estes lugares sao necessarios para evitar a sodomia e a orgia dos hereges.

Veja a diferença, a sexualidade do homem nao sofre nenhuma alteraçao, ele tem permissao para estuprar, visitar prostitutas e casar com uma mulher casta, enquanto as mulheres sao proibidas de qualquer forma de prazer, a esposa faz sexo pra procriaçao e a prostituta como meio de sobrevivência, ambas sob o dominio do patriarcado que decidem o que fazer com o corpo delas.

Foi proibido o uso de plantas contraceptivas, a parteira foi substituida pelo médico homem, a gestaçao e o nascimento passam a ser controlados pelo estado.

O corpo como maquina ou a disciplina do corpo
Descartes e Hobbes: Filosofia mecânica, o corpo é comparado a uma maquina com intuito de maximizar sua utilidade no trabalho, a maquina tornou-se modelo do novo comportamento social.
Foucault demonstrou que a mecanizaçao do corpo envolve a repressao dos desejos, emoçoes ou outras formas de comportamentos que deveriam ser erradicadas. O produto desta alienaçao do corpo é o desenvolvimento da identidade individual, o conflito da mente e do corpo (alter ego) representa o nascimento do individual na sociedade capitalista, moldado pela disciplina laboral.